Bons ventos para içamento de cargas

Por: Johnny Forster (*)

O mercado de energia renovável no Brasil, especialmente o segmento eólico, vive um dos seus melhores momentos desde as últimas cinco décadas, período em que foram criadas a Eletrosul, Eletronorte e Itaipu, grandes companhias brasileiras geradoras de energia elétrica.

Segundo dados da ABEEólica (Associação Brasileira de Energia Eólica), atualmente o Brasil detém uma capacidade já instalada capaz de gerar 21,5 GW (GW = Gigawatt, 1GW representa 1.000.000.000 de Watts) de energia renovável. De acordo com informações no portal da Agência Brasil, 1 GW de potência instalada é capaz de abastecer 500 mil residências e atender o consumo confortavelmente de 2 milhões de brasileiros.

Para termos a dimensão de quanto é importante o segmento eólico no Brasil e o que representam os atuais 21,5 GW de capacidade de geração de energia, Itaipu que é uma empresa binacional (Brasil e Paraguai se associaram nos anos 1970 para a construção da UHE – usina hidrelétrica), marco da engenharia e do setor elétrico no mundo, pode gerar 14 GW. Os parques eólicos em operação no Brasil que geram 21,5 GW, somados geram 1,5 vez mais energia renovável que toda a capacidade da UHE de Itaipu.

Ainda para trazer mais “luz” da importância da indústria eólica para o Brasil deve-se lembrar que dos seus 21,5 GW de energia gerada no país, aproximadamente 10 GW surgiram com os grandes projetos eólicos construídos entre os anos 2000 a 2010. E a capacidade de geração eólica dobrou, passando de 10 GW para 21,5 GW, nos últimos 10 anos. Toda essa “movimentação“ do setor eólico garantiu ao Brasil dezenas de bilhões de dólares de investimentos e centenas de milhares de novos empregos em toda a cadeia de suprimentos.

Para demonstrar que “os ventos nunca estiveram tão favoráveis”, a ABEEólica informa que o segmento eólico brasileiro ainda possui um potencial para atingir mais de 1.500 GW de geração de energia renovável nos seus parques onshore (em terra) e offshore (no mar) nas próximas décadas. Deve-se destacar também que ocupamos a sexta posição no ranking mundial de capacidade instalada onshore, fato que garante ao nosso segmento eólico um papel fundamental que ajudará o mundo atingir as metas de emissão zero de carbono no ano de 2050.

Cadeia de içamento de cargas no Brasil

Apesar dos impactos ainda sentidos da Covid-19 na cadeia logística mundial de insumos, que aumentaram os custos e os prazos de entrega dos sistemas de engenharia e dos acessórios para içamento e que também afetou o Brasil, vivemos um dos melhores momentos da atividade de movimentação de cargas no país.

Os grandes e valiosos equipamentos utilizados nos parques eólicos em construção precisam ser elevados nas fábricas onde são produzidos no país, ou nos portos se forem importados ou quando estão muito distantes das obras. Isso precisa ser feito garantindo a segurança dos trabalhadores, a integridade física da carga e num prazo adequado para a execução dos projetos, fatos que envolvem toda cadeia de içamento de cargas.

Sob o aspecto da segurança para os trabalhadores que fazem içamento de cargas no Brasil o país também passa por um marco histórico

Em 2020 a norma regulamentadora NR-1 foi revisada. Ela dispõe de uma forma geral sobre o gerenciamento dos riscos ocupacionais nas empresas instaladas no Brasil. É sempre importante relembrar que movimentação de cargas é uma atividade de (grande) risco ocupacional e por isso possui uma norma regulamentadora específica, a NR-11.  Com a “nova” NR-1 criou-se o GRO (gerenciamento de risco ocupacional) que é o mecanismo de gestão que as empresas são obrigadas adotar para garantir a segurança em todas as suas atividades ocupacionais que seus trabalhadores realizarem, principalmente no içamento de cargas.

Além da revisão na NR-1 que trará muitos benefícios para a segurança dos trabalhadores, a CE-099:010.001 (Comissão de Estudo de Qualificação de Pessoas para Movimentação de Cargas com Equipamentos de Guindar) da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) elaborou nos últimos dois anos e aprovou em 2022 o texto base da NBR (norma técnica brasileira) que definirá os requisitos para qualificação e certificação de pessoas para içamento e movimentação de carga com equipamentos de guindar.

Há poucos dias o texto base da NBR foi encaminhado à ABNT/DT/GPR* para ser submetido à Consulta Nacional por 30 dias. É importante esclarecer que se as recomendações/sugestões recebidas após a referida Consulta forem pela aprovação sem restrições, o Projeto de Norma Técnica (NBR) ficará automaticamente aprovado como Norma Brasileira.

Esta NBR quando aprovada será muito importante porque define tecnicamente as qualificações dos profissionais envolvidos no içamento (Sinaleiro amarrador, Projetista de movimentação e Supervisor de movimentação de carga). Ex: os pré-requisitos para os candidatos à qualificação e certificação, a escolaridade e experiência profissional, os exames de qualificação, etc.

Um avanço normativo técnico muito importante que a NBR trará é a formalização que o Sinaleiro amarrador de carga é o profissional responsável que garante através da inspeção obrigatória, antes de todo içamento, que os acessórios aplicados na amarração de cargas (manilhas, lingas de correntes, cintas têxteis e lingas de cabos de aço) atendem as exigências das NBR’s dos mesmos.

Exemplo: O Sinaleiro amarrador somente poderá permitir o uso de manilhas que possuem a identificação correta da capacidade de carga, a rastreabilidade do fabricante, o nome do fabricante, o grau do aço e os critérios da norma de fabricação. As lingas de correntes deverão possuir em sua identificação a capacidade, a rastreabilidade, o nome do fabricante, o grau do aço e os critérios da norma de fabricação. As cintas têxteis permitidas serão aquelas que possuírem a identificação correta e a sua capacidade. Também existirão exigências técnicas para as lingas de cabo de aço.

Estas qualificações determinadas na NBR para Sinaleiro amarrador, Projetista de movimentação e Supervisor de movimentação de carga trarão mais segurança para o içamento de cargas, e consequentemente na montagem dos parques eólicos.

*Nota do autor: ABNT/DT/GPR: GPR – Gerência do Processo de Normalização da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

Relação entre o ótimo momento do mercado eólico brasileiro e a cadeia de içamento de cargas no país

É uma relação direta e muito saudável. Numa análise macro e microeconômica são mais que perceptíveis os benefícios proporcionados pelo boom do mercado eólico na cadeia de içamento de cargas no Brasil.

Para a produção dos grandes equipamentos no Brasil (aerogeradores, pás, torres, transformadores de energia para as subestações de energia, etc…) ou para a importação dos mesmos, os grandes players mundiais que no país atuam necessitam fazer elevação de cargas com segurança para a montagem das dezenas de parques eólicos onshore. Isso gera empregos com a locação de guindastes, contratação de profissionais especializados (Sinaleiro amarrador, Projetista e Supervisor de movimentação de carga) e a compra de acessórios para içamento de cargas.

Sob o aspecto da segurança é fácil perceber os ganhos para os trabalhadores. Eles passam por rigorosos programas de treinamentos nas fábricas e nos parques eólicos antes que sejam autorizados iniciarem algum içamento de cargas. Estes profissionais se beneficiam ao adquirirem qualificações que aumentam a sua empregabilidade no setor eólico e que também são úteis para outros setores da indústria brasileira de uma forma geral.

Ainda há de se analisar sob o prisma técnico que para a fabricação e/ou montagem de um aerogerador em um parque eólico onshore no Brasil as torres podem atingir 100 metros de altura, existindo modelos na Europa que chegam até 200 metros e que em breve serão realidade no país. Com estas alturas de torres o içamento de cargas pode se tornar muito crítico se os acessórios utilizados não cumprirem as normas técnicas. As qualificações determinadas na NBR citada anteriormente serão obrigatórias para Sinaleiro amarrador, Projetista e também Supervisor de movimentação de carga e fortalecerão a função destes profissionais no içamento de carga.

Segundo estimativas da ABEEólica, do governo federal e de alguns governos estaduais, além de especialistas do setor eólico, nos próximos cinco anos, ou um pouco mais, teremos parques eólicos offshore em construção no Brasil. Isso será um fator técnico complexo para se realizar um içamento de cargas, porque em um parque eólico montado no mar, além da criticidade para elevação de todo o conjunto aerogerador, o plano de rigging (plano para elevação da carga) precisa considerar o sistema de ancoragem (mooring) que suporta a movimentação das ondas e a velocidade dos ventos. O içamento de cargas offshore também é muito dependente do desempenho do guindaste durante a elevação dos componentes.

Dito isto, pode-se concluir que o içamento de cargas que sempre teve papel estratégico na montagem de um parque eólico onshore ou offshore, ganhará mais relevância e muitos investimentos no Brasil nos próximos anos.

(*) Johnny Forster é Engenheiro Eletricista, pós-graduado em Marketing e mestrando em Administração, possui vasta experiência na área industrial no Brasil e no exterior tendo conduzido inúmeros projetos cujo foco era a Segurança do trabalhador e a otimização dos processos. Formado em Rigging pelo ITI (Industrial Training International) – EUA é membro de Comitês que elaboram ou revisam normas técnicas (NBR’s) no Brasil. Atualmente está responsável pela gerência técnica e comercial da The CROSBY Group nas regiões Norte, Nordeste, Sul, Centro-Oeste e nos estados de MG e ES, além de atuar como Engenheiro RT (Responsável Técnico) legal da empresa junto ao CREA (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia).

Fonte: Crane Brasil – https://cranebrasil.com.br/bons-ventos-para-icamento-de-cargas/