Termina na sexta-feira 10 o prazo para que os governos estaduais definam e apresentem ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) as suas obras de infraestrutura prioritárias. O cronograma vem de uma promessa de campanha do petista.
Segundo o governo, haverá reuniões bilaterais a partir de 13 de fevereiro entre o ministro da Casa Civil, Rui Costa, com cada governador, para fechar as propostas no fim do mês. Como Lula ainda deve ouvir as sugestões dos prefeitos, há uma previsão de que a carteira de obras seja montada até março.
O plano aumenta as expectativas sobre os impactos das obras de infraestrutura no desenvolvimento econômico, uma vez que muitas delas devem se relacionar com a produção agrícola e industrial no país.
Essas obras devem estar vinculadas ao novo Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, que está previsto para ser relançado com financiamentos a projetos de logística, de geração de energia e de melhorias urbanas, por meio de recursos do Banco de Desenvolvimento Social, o BNDES.
O governo diz que a primeira meta é dar andamento a obras inacabadas. Durante a posse de Aloizio Mercadante no BNDES, na segunda-feira 6, Lula estimou que há 14 mil obras paradas no Brasil atualmente.
Para Renata Moura Sena, especialista em infraestrutura e professora da PUC-SP, as regiões Centro-Oeste e Norte são as que mais necessitam de obras de logística, por conta do escoamento da produção agrícola. É preciso, segundo ela, investir em projetos que melhorem as condições das rodovias e reduzam o tráfego de caminhões.
“O Brasil é muito produtivo da porteira para dentro e menos produtivo da porteira para fora”, afirma. “Até chegar no porto, as perdas são muito altas e o frete é muito caro.”
Segundo dados recentes da Confederação Nacional de Transportes, o transporte rodoviário é responsável por 64,9% dos escoamento de carga no país.
Ainda de acordo com a CNT, apenas 12% destas rodovias são pavimentadas. Diante disso, o Brasil precisaria aumentar em 18 vezes para alcançar a densidade norte-americana e em 17 vezes para se equiparar à chinesa.
Enquanto isso, o modal ferroviário corresponde a somente 14,95% do transporte de cargas no país, com cerca de 31 mil quilômetros. A densidade da malha brasileira é de apenas 3,6 km a cada mil quilômetros quadrados, muito menor que nos Estados Unidos (29,9 km/mil km²) e na China (13,7 km/mil km²).
Já o transporte em rios e mares corresponde a 15,7% da matriz de transportes de cargas e, em 2019, foi apontado na posição 104 entre 141 economias mundiais, num ranking sobre a qualidade dos serviços portuários.
O Plano Nacional de Logística e Transportes de 2005 previa que, em 2025, chegaríamos a um equilíbrio na distribuição entre estradas, ferrovias e navegação, nos percentuais de 30%, 35% e 29%, respectivamente. A três anos de alcançarmos essa meta, esses números seguem muito distantes.
A engenheira Jéssica Helena de Lima, professora da Universidade Federal de Alagoas, o governo precisa superar esse panorama por conta da geração de custos logísticos altos e da perda de competitividade dos nossos produtos no cenário internacional.
“Não conseguiremos equilibrar esta balança para 2025, mas os esforços devem ser neste sentido”, afirma.
Para 2023, o governo federal reservou 18,8 bilhões de reais a serem aplicados na logística nacional de transportes, o que igualaria a capacidade de investimento aos patamares de 2016.
A partir da opinião de especialistas, políticos e entidades, CartaCapital enumerou cinco projetos de infraestrutura logística considerados fundamentais para a carteira de obras do governo.
Confira:
Ferrogrão
Nascido em 2012, o projeto da Ferrogrão prevê a criação de 933 quilômetros de ferrovias para ligar o município de Sinop, em Mato Grosso, a Itaituba, no Pará, para melhorar o escoamento de grãos, sobretudo a soja. Dessa forma, os produtores mato-grossenses se beneficiariam com o acesso mais facilitado aos portos no Norte.
O empreendimento é defendido como prioridade pelo governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), alinhado ao agronegócio. O ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), também indica ser favorável.
Estimativas indicam a necessidade de investimentos de pelo menos 31 bilhões de reais.
O projeto, porém, é criticado por ambientalistas. Pesquisadores da PUC-Rio indicaram possível aumento no desmatamento em 2.043 quilômetros quadrados, por conta da alta na demanda por terras e do incentivo à produção.
A questão ambiental foi responsável pela paralisação do projeto pelo Supremo Tribunal Federal, a partir de uma ação do PSOL, com o argumento de que a Ferrogrão alteraria os limites do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará. O Parque é uma unidade de preservação e seria atravessado pela ferrovia. O empreendimento excluiria 832 hectares do local, o que, segundo críticos, afetaria povos indígenas da Bacia do Xingu.
O julgamento sobre o caso no STF está marcado para 31 de maio e pode destravar a obra. Há uma expectativa, ainda, de que Renan Filho ouça o Ministério do Meio Ambiente em relação ao tema.
A especialista Renata Moura Sena defende a obra como prioridade, mas cobra cuidado por conta do debate ambiental. A grande vantagem do empreendimento seria, segundo ela, a redução da movimentação de caminhões nas rodovias, sobretudo na BR-163.
Na mesma linha, Jessica Helena de Lima aponta a obra como fundamental.
“A Ferrogrão é uma obra de suma importância para melhorar o cenário logístico nacional, barateando fretes e impulsionando a exportação pelos portos da Região Norte”, afirma a professora da UFAL.
Acessos ao Porto de Santos
Moura Sena ironiza as condições das rodovias que dão acesso ao maior terminal portuário da América Latina, o Porto de Santos: “Péssimo é uma forma elogiosa de chamar o estado das vias. Nós estamos num grau de ausência de manutenção gigantesco. Os próprios caminhoneiros estão reclamando das condições terríveis”.
Há, ainda, uma demanda para aprofundar o canal marítimo, para ampliar a capacidade de transporte de carga. A profundidade é considerada limitada. Segundo Moura Sena, navios transportam menos carga do que poderiam na região, para conseguirem transitar no canal.
Instalado no estado de São Paulo desde 1892, o Porto de Santos é tema de uma das principais discussões do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com o governo Lula.
A estimativa do governo anterior é de que haveria uma injeção de 1,4 bilhão de reais em recursos públicos para a melhoria dos acessos e o aprofundamento do canal neste ano.
Mas o governador de São Paulo, que foi ministro da Infraestrutura no governo de Jair Bolsonaro (PL), quer privatizar o Porto de Santos para atrair investimentos. A ideia não está descartada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa. Porém, o ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França, faz frontal resistência à proposta.
Ferrovias de Integração do Centro-Oeste
No documento Balanço 2022 e Perspectivas 2023, a Confederação Nacional da Agricultura cobrou a implantação da Ferrovia de Integração Centro-Oeste e da Ferrovia de Integração Centro-Oeste-Leste como primordial.
O projeto foi criado no 2º mandato do petista. Na semana passada, a Casa Civil publicou uma nota em que diz ter avançado nessas obras. Segundo a pasta, o primeiro trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste já foi aterrado, e quase oito mil toneladas de trilhos já foram adquiridas para a obra.
A previsão de investimentos é de 2,73 bilhões de reais nesse empreendimento.
A Ferrovia também é voltada para o escoamento da produção de grãos. São projetados 1.641 quilômetros de extensão, em três trechos: de Mara Rosa (GO) a Água Boa (MT), com 383 quilômetros; de Água Boa a Lucas do Rio Verde (MT), com 505 quilômetros; e de Lucas do Rio Verde a Vilhena (RO), com 646 quilômetros.
De acordo com o ministro Renan Filho, está no seu plano de 100 dias a finalização sobre os estudos relacionados a essas rodovias, que incluem a possibilidade de concessão.
Ferrovia Norte-Sul
O Ministério dos Transportes também elencou como prioridade até abril o destravamento da obra entre Ouro Verde de Goiás e Rio Verde (GO), trecho de cerca de 280 quilômetros.
Em construção há 30 anos, a Ferrovia deve se estender por quatro mil quilômetros, com passagens em todas as cinco regiões brasileiras. A proposta é que o canal seja uma “espinha dorsal” da malha ferroviária do País.
A conclusão da obra é mencionada pela professora Jessica Helena de Lima como prioritária, por conta do seu potencial de conexão nacional.
Além disso, uma obra considerada prioritária pelo governador do Carlos Brandão (PSB), é a da Estrada de Ferro do Maranhão, no âmbito do projeto Grão-Pará Maranhão.
O trecho de 520 quilômetros ligaria o Terminal Portuário de Alcântara ao município de Açailândia, o que permitiria o acesso da carga de grão vinda da região Centro-Oeste por meio da Ferrovia Norte-Sul.
De acordo com o governo estadual, o empreendimento receberá investimentos de empresários alemães. Ao mesmo tempo, Brandão apresentou o plano ao ministro Integração e do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, em 24 de janeiro, como “um dos projetos mais importantes do Brasil”.
Ferrovia Transnordestina
No fim de janeiro, o governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), disse que a obra da Ferrovia Transnordestina é “fundamental para o desenvolvimento da Região Nordeste” e demonstrou compromisso em acelerar a obra.
Com 1.753 quilômetros de extensão, a ferrovia tem passagem por 81 municípios, com saída de Eliseu Martins, no estado do Piauí, em direção aos portos do Pecém, no Ceará, e Suape, em Pernambuco.
A Ferrovia começou a ser construída em 2006, com previsão de conclusão em quatro anos, mas a obra se arrasta desde então. Metade do plano foi feito até agora. A partir de 2017, a obra foi alvo de restrições do Tribunal de Contas da União, em função de questionamentos judiciais.
O orçamento é previsto em 8,9 bilhões de reais. A ligação com o Ceará tem previsão para conclusão em 2025. O ministro Renan Filho incluiu uma visita às obras da Transnordestina no seu plano de 100 dias. A obra também é mencionada como prioridade pelas duas especialistas ouvidas pela reportagem.
Fonte: Carta Capital – https://www.cartacapital.com.br/carta-capital/5-obras-de-infraestrutura-logistica-que-podem-ser-priorizadas-pelo-governo/