Ela está desde 2015 como diretora executiva nacional do SEST SENAT, o braço do Sistema ‘S’ que atende ao transporte em todos os modais. Em entrevista à Revista SETCESP, Nicole Goulart que é advogada, falou das transformações e avanços que a instituição tem oferecido ao setor nos últimos anos
Como o SEST SENAT trabalha para melhorar o desempenho do setor de transporte e mostrar seu valor junto às empresas contribuintes?
Antes que o SEST (Serviço Social do Transporte) e o SENAT (Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte) fossem criados, fazíamos parte do ‘S’ da indústria (SESI e SENAI), e não tínhamos um real protagonismo, do que era o setor de transporte para o País. Desde a nossa constituição, em 1993, a gente defende que a nossa capacitação profissional, melhore o setor transportador. Eu gosto de repetir essa frase que é falada por muitos empresários: não existe empresa forte em um setor fraco.
Queremos fomentar que o empresário não perde tempo nem dinheiro investindo na qualificação profissional. O que falamos repetidamente, é que é importante para o empresário, ter esse funcionário qualificado, e exatamente por isso, é importante ele liberar esse profissional para fazer os cursos. Embora a gente saiba que é difícil conciliar as agendas dos profissionais com as agendas das empresas, mas até por este motivo, criamos algumas unidades com horários diferenciados de atendimento. Com a pandemia a gente acelerou a disponibilização de serviços e cursos online, para que esse profissional não precise se deslocar até a unidade para aprender ou se cuidar como no caso de uma consulta nutricional ou psicológica, por exemplo.
Como o sistema S pode auxiliar as empresas na contratação de mais mulheres, especialmente, para o cargo de motoristas profissionais?
Temos um Programa de cunho social relevante, que oferta carteira de motorista profissional à mulher, para que possa ingressar no mercado de trabalho. Nós já formamos 26 mulheres e o número pode até parecer pequeno, mas vale lembrar que, o curso é de longa duração e 19 delas já saíram empregadas. Isso é um indicativo de que estamos no caminho certo. A intenção não é só trazer mulheres para a profissão de motoristas, mas tornar esse setor possível para elas. Uma outra coisa que tem no nosso radar, é mobilizar o setor público para garantir segurança e infraestrutura, como banheiros adequados nas estradas para essas mulheres motoristas.
É interessante ver que a gente já tem até empresas de transportes que possuem uma política muito forte de atração de mulheres, e conseguiram flexibilizar jornada e rota para elas. A gente luta por igualdade, mas aqui o que precisamos é tratar igualmente com atenção as devidas especificidades de cada um, eu diria. O empresário precisa estar consciente de que vai ter que se adequar para contratá-las, obviamente, porque a profissional precisa de um outro tipo de tratamento. São três pilares a serem trabalhados: a Confederação Nacional do Transporte (CNT) que atua no poder público, o SEST SENAT que faz a interlocução com essa profissional e o empresário que está sempre conosco através das entidades. Em razão disso, sempre destaco a valorização da importância do processo associativo dos sindicatos no país.
Quantas unidades tem hoje o SEST SENAT e quais as necessidades de adaptação regional são consideradas, para estar presente nos mais diferentes lugares do País?
São 160 unidades, a mais nova inaugurada em julho em Curvelo-MG. Estamos em processo de expansão, com 52 novas unidades em diferentes estágios, seja em projeto executivo ou licitação de obra. As diferenças regionais são imensas. Por isso, temos o que chamamos de unidades vocacionais: algumas que atendem muito mais o transporte de passageiros, enquanto outras o transporte de cargas, e por aí vai. Em São Paulo, a do Parque Novo Mundo tem uma tendência para a cargas, já a de Vila Jaguara, para passageiros. Isso influencia em todo o portfólio de serviços e até em nossos turnos de trabalho. Precisamos nos adequar a necessidade das empresas. A gente acredita na estrutura física porque é importante ter um lugar para acolher o nosso profissional, mas também não nos limitamos aos muros das unidades. Inclusive, um dos grandes avanços que a pandemia nos trouxe foi acelerar os projetos digitais, com isso, a equipe da unidade de São Paulo, por exemplo, pode atender pessoas no Pará em consultas e treinamentos online. Percebemos que mesmo estando, cada vez mais, regionalizados estamos também mais customizados. A intenção é deixar de ser um produto de prateleira (engessado) para atender o interesse do cliente que são as empresas e profissionais do transporte, e que estão em constante mudança.
Há uma enorme parcela de pessoas desempregadas, por outro lado as empresas, em sua maioria, sofrem para preencher as vagas em aberto por falta de qualificação. Como o SEST SENAT pode ser um agente de mudança dessa realidade?
Hoje 65% dos cursos do SENAT são os regulamentados. Quando avaliamos o percentual de participação da comunidade, de pessoas que não são do setor inscritas neles, chega-se a uma média de 15%, que são pessoas que estão tentando entrar no nosso setor, porque nos enxergam como uma oportunidade. O atendimento de saúde à comunidade local faz com que o SEST fomente o público do SENAT e vice-versa. É mais fácil cuidar da saúde, na grande parte das vezes, é o que a comunidade busca. O SEST tem trabalhado com esse corpo a corpo, buscando promover uma atratividade para o setor, fomentar uma remuneração adequada, o nosso objetivo é mostrar que este setor é bom para trabalhar, e tirar um pouco desse viés negativista. Esse é o nosso grande objetivo.
Como a educação profissional pode ajudar o jovem que não tem experiência a ingressar no mercado de trabalho, especificamente no setor de transporte?
Primeiro quero dizer que sabemos que a cota complementar do Jovem Aprendiz é um encargo pesado para as transportadoras, porque o motorista está incluso no cálculo dessa cota. A CNT apresentou uma emenda na Medida Provisória de Empregabilidade nº 1116/2022, reforçando a necessidade de exclusão do motorista da cota, pois se trata de uma profissão que exige uma regulamentação distinta com critérios específicos. Essa é uma pauta bem impopular, e é preciso reforçar: não é que a gente não queira acolher o jovem, o que queremos é trazê-los para funções que ele possa realmente executar dentro das empresas. Pensando nisso, lançamos um projeto de qualificação voltado para esse público. Então quando o empresário contrata o jovem que passa por esse aperfeiçoamento, ele já sabe o que uma empresa de transporte faz. O nosso objetivo é trazer o jovem para a unidade do SEST SENAT e entregá-lo formado para a empresa. Enquanto isso, trabalhamos nessa medida provisória para que depois de dois anos (que é o prazo do contrato obrigatório) a empresa possa ficar com ele, e ele continue integrado a cota. Porque antes havia um desestímulo à contratação, pois se a empresa contratasse o Jovem Aprendiz, ela era obrigada a aumentar cota. Foi importante conseguir alterar este ponto.
Que motivos as empresas têm para estimular seus profissionais a utilizarem os atendimentos e treinamentos do SEST SENAT?
A necessidade. É um custo de 2,5% sobre a folha de pagamento e reforço a importância da valorização deste recurso A intenção do SEST SENAT não é fazer caixa, e sim, devolver isso para o empresário com a qualidade que ele precisa. É importante para a empresa que ela tenha mão de obra qualificada e saudável. A ideia não é fazer disso um custo, mas sim, um investimento. É muito legal ver que os grandes empresários estão cada vez mais conscientes, investindo e apostando nas melhorias do SEST SENAT e contribuindo com a gente, sugerindo o que eles querem e precisam para que possamos desenvolver e atender cada vez mais empresas.
Aqui em São Paulo, o que podemos esperar de novo do SEST SENAT? Alguma nova unidade, ou lançamento de algum serviço?
Temos uma unidade prevista para ser inaugurada em breve na cidade de São Carlos. Também fizemos a aquisição de um prédio no bairro de Santo Amaro, na capital, que já está em reforma. Ainda temos previsão de futuras instalações em Barueri, Franca e Paulínia e a revitalização da unidade Vila Jaguara que deve acontecer logo mais. O que a gente vem fazendo em São Paulo é uma aproximação dos setores tanto de carga quanto de passageiros, trabalhamos nesse momento para ofertar os cursos regulamentados virtualmente (estes são todos aqueles treinamentos que são regulamentados pelo CONTRAN, que inclui o MOPP – Movimentação Operacional de Produtos Perigosos) isso é um grande avanço, porque esses cursos são obrigatórios e têm validade. O Detran de São Paulo acabou de liberar a oferta desse curso de forma virtual, e nós estamos adequando os nossos sistemas. É o grande lançamento que queremos fazer ainda esse ano.
Daqui a pouco também vamos lançar o ‘Motorista Série A’, um curso para aperfeiçoamento do motorista sendo de menor duração. Já adianto que ainda teremos a ‘Feira de Empregabilidade’ em setembro, na unidade de Santo André/SP, será a primeira vez dessa ação, com objetivo de proporcionar esse match de quem quer contratar com quem precisa ser contratado.
Que iniciativas de atuação do SEST SENAT durante a pandemia ficarão de legado?
A pandemia ajudou a encurtar distâncias, passamos também a ter um novo olhar sobre a importância do cuidado com o trabalhador. O transporte não parou, a gente viu o alimento no mercado, o pão na padaria, o remédio na farmácia e tudo graças ao transporte. Isso trouxe uma valorização do setor que foi classificado como essencial, em um decreto fruto do trabalho da própria CNT. Importante destacar que muitas empresas começaram a demonstrar que a gente pode trabalhar melhor junto do que separado e o setor de transporte saiu mais fortalecido.
De vez em quando, surge um e outro projeto que prevê cortes do repasse da contribuição ao Sistema ‘S’. Na sua visão, o porque isso não deveria ser feito e qual o papel do sistema ‘S’ para o desenvolvimento social?
Primeiro, vamos dar um passo atrás e entender o porquê o SEST SENAT foi criado. Antes da Constituição de 1988, os outros ‘S’ foram criados porque o estado chegou à conclusão de que não conseguiria suprir o que as empresas precisavam, simplesmente, ele não é eficiente para assumir essa responsabilidade, e assim, delegou a iniciativa privada o Sistema ‘S’. A nível de comparação, um curso do Instituto Técnico Federal é bem mais caro que um curso do Sistema ‘S’. A gente já fez essas contas. Na minha opinião, cortar a arrecadação do ‘S’ é um retrocesso. Pensa em um curso regulamentado que é obrigatório, e o profissional recebe de graça, se não fosse assim, a empresa teria que pagar por esse treinamento. Só que não é apenas o valor, é preciso garantir a qualidade desses cursos.
Falar de sistema ‘S’ é falar de milhões de brasileiros. Nosso foco é qualificação profissional. No caso da indústria, ela mantém ainda a educação básica. Então, se não fizermos isso, quem vai fazer esse trabalho? Me diz, o SUS (Sistema Único de Saúde) tem condição de disponibilizar psicologia e fisioterapia para todos os profissionais e seus familiares com disponibilidade de agendamento em menos de um mês? No SEST SENAT, por exemplo, isso é possível, está disponível, de forma presencial e online… Eu sei que tem empresas com planos de saúde para os seus profissionais, mas a gente precisa olhar a realidade do nosso país de forma geral. Cortar a arrecadação, agravaria, e muito a crise econômica. São as pessoas que movem as empresas e as empresas que movem a economia. Não há como falar em um país competitivo, se a gente não valorizar a educação. E eu acredito veementemente, que o Governo Federal não tem condição de fazer o que o Sistema ‘S’ faz neste quesito. Quando surgem estes assuntos em pauta, é porque há uma completa desinformação.
Quais desafios o SEST SENAT tem pela frente?
Mostrar a importância da nossa contribuição e do nosso trabalho. Promover uma transformação digital em nosso setor, porque ele possui hoje uma média de pessoas com mais idade, grande parte entre 49 a 54 anos. Atrair jovens, para oxigenar e colocar em postos de trabalho que estão abertos, e obviamente, estar mais próximo do empresário de transporte, por isso agradeço o convite de participar dessa entrevista. Os sindicatos são importantíssimos para nós.
Fonte: SETCESP – https://setcesp.org.br/noticias/nicole-goulart-o-empresario-nao-perde-tempo-e-nem-dinheiro-investindo-na-qualificacao-profissional/