Apesar dos esforços dos atuais administradores da Petrobras para mostrar que a estatal tem controles internos que dificultam uma guinada na sua estratégia, especialistas acreditam que o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a partir de 2023, vai levar a novas diretrizes na companhia, principalmente nos temas da alocação de investimentos e do pagamento de dividendos aos acionistas.
Na semana passada, a Petrobras anunciou distribuição de dividendos de R$ 43,7 bilhões, relativa aos resultados do terceiro trimestre, divulgados na quinta-feira (3). Com esse pagamento, a estatal já aprovou quase R$ 180 bilhões em proventos relativos aos resultados financeiros dos três trimestres concluídos em 2022.
O pagamento referente ao terceiro trimestre foi judicializado pela Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (Anapetro) e foi alvo de críticas de integrantes do PT. Na sexta-feira, o subprocurador-geral do Ministério Público Federal (MPF),Lucas Furtado, abriu representação no Tribunal de Contas da União (TCU) solicitando a suspensão do pagamento, diante de possível risco à sustentabilidade financeira e esvaziamento da disponibilidade de caixa da empresa.
Na visão do partido do presidente eleito, o alto pagamento de dividendos limita a capacidade de investimento da estatal. Mesmo com a divulgação de um balanço considerado positivo, as ações da companhia caíram na semana passada, com recuo de 5,23% nos papéis ordinários e queda de 5,51% nas ações preferenciais.
Na sexta-feira, em teleconferências com analistas, o diretor executivo financeiro e de relacionamento com investidores, Rodrigo Araujo, disse que empresa manteve o processo de análise feito todos os trimestres para o pagamento de dividendos, com avaliação da sustentabilidade financeira e geração de caixa nos 18 meses seguintes. Ele ressaltou que a companhia retornou este ano para a sociedade 55% da geração de caixa, por meio de tributos e dividendos. “Um dos pilares da nossa política de dividendos é assegurar sustentabilidade a curto, médio e longo prazos”.
A atual política de dividendos da Petrobras passou a valer no terceiro trimestre de 2021 e prevê que, quando tiver dívida bruta menor que US$ 65 bilhões, a empresa pode distribuir aos acionistas em proventos 60% da diferença entre o fluxo de caixa operacional e os investimentos, além de prever a possibilidade de pagamentos extraordinários, desde que não afetem a sustentabilidade financeira. Ao fim do terceiro trimestre a dívida estava em US$ 54,3 bilhões. A previsão, entretanto, é que o endividamento suba no próximo ano, segundo o diretor financeiro, por causa da entrada em operação de plataformas que são afretadas.
Questionado sobre eventuais mudanças na política de dividendos no novo governo, Araujo explicou que decisões sobre o tema são tomadas pelo conselho de administração, que pode, na prática, alterar a qualquer momento as políticas que são de competência do colegiado. O conselho deve ser reformulado em 2023, dado que o futuro governo deve indicar novos executivos para a estatal. “Os ganhadores da eleição têm sinalizado que vão usar a Petrobras para fortalecer investimentos públicos”, diz um especialista do setor.
Assim, a previsão é que o retorno do PT ao governo resulte em menor distribuição de dividendos aos acionistas e aumento nos investimentos, principalmente nas áreas de refino e de energia renovável, avaliam analistas.
A Petrobras deve divulgar neste mês o planejamento estratégico de 2023 a 2027. Elaborado pela atual gestão, o documento não deve ter mudanças de estratégia em relação ao apresentado ao fim do ano passado. Desde 2015, a Petrobras tem focado investimentos em exploração e produção de petróleo e gás natural em águas profundas e conduz a venda de ativos que não são considerados estratégicos. Os diretores da empresa sinalizaram, por exemplo, que o plano deve manter a intenção de buscar oportunidades de exploração e produção no Norte e Nordeste.
Na mesma teleconferência na sexta-feira, o diretor executivo de relacionamento institucional e sustentabilidade da Petrobras, Rafael Chaves, disse que o novo plano está em avaliação por gerentes-executivos e vai passar pelo crivo da diretoria executiva e do conselho de administração. Segundo ele, não haverá mudanças em termos de disciplina de capital.
O diretor financeiro reforçou que a definição de investimentos tem um tempo de aprovação relativamente longo, com revisões anuais, que consideram o valor presente líquido (VPL) sobre o investimento como referência, além de análises de risco quantitativas e qualitativas. “Quanto menos conhecemos um negócio, mais longo e complexo é o ciclo de aprovação de um projeto”, disse.
Ainda assim, especialistas apostam que, a partir de 2023, a estatal vai investir em áreas que têm recebido menos destaque, em especial na ampliação das refinarias existentes.
“As propostas de Lula para a Petrobras focam na construção de nova capacidade de refino, similar à estratégia nos seus mandatos anteriores, o que aumentou significativamente a dívida da companhia”, disseram os analistas Fernando Valle e Brett Gibbs, da Bloomberg Intelligence, em relatório.
Araujo disse que, até sexta, a diretoria ainda não tinha informações sobre a participação da estatal na transição de governo.
Fonte: Valor – https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/11/07/diretoria-aponta-continuidade-mas-petrobras-deve-ter-guinada.ghtml