Em um pacote lançado para acalmar os caminhoneiros, grupo que já organizou 13 tentativas de greve nos últimos dois anos e meio, o presidente Jair Bolsonaro assinou medida provisória que flexibiliza as regras de pesagem de veículos pesados, mas criou conflito com concessionárias de rodovias e governos estaduais.
A MP 1.050, enviada na quarta-feira ao Congresso Nacional, aumentou de 10% para 12,5% o limite de tolerância do peso permitido por eixo em caminhões acima de 50 toneladas. No caso dos veículos com peso bruto total inferior a 50 toneladas, que correspondem à maioria da frota, essa margem de tolerância foi extinta.
O anúncio foi bem recebido por transportadoras, caminhoneiros autônomos e donos de cargas. A expectativa do governo é livrar a categoria de multas que considera injustas e baratear o custo do frete, que muitas vezes já incorpora o risco de autuação.
No entanto, a flexibilização gerou reclamações das operadoras privadas de rodovias e autarquias estaduais responsáveis pela conservação das estradas, além de construtoras contratadas para fazer obras de manutenção. Para elas, o reflexo da medida é a degradação mais rápida do pavimento e aumento do risco à segurança, com caminhões estimulados a circular com excesso de peso por eixo e maior dificuldade de frenagem.
“A medida representa uma agressão à engenharia rodoviária no Brasil e uma agressão ao próprio local de trabalho dos caminhoneiros”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), Marco Aurélio Barcelos.
Executivos de concessionárias ouvidos reservadamente pelo Valor disseram que, diante da possibilidade de deterioração do pavimento, cogitam entrar com pedidos de reequilíbrio dos contratos para compensar, nas tarifas de pedágio, suas despesas adicionais com manutenção das rodovias. Barcelos preferiu não comentar.
A ABDER, entidade que reúne 26 dos 27 departamentos de estradas de rodagem estaduais, pretende apontar tecnicamente, durante a tramitação da MP, como pode haver comprometimento acelerado das vias. Os Estados administram cerca de 180 mil quilômetros de estradas pavimentadas no país.
É louvável todo e qualquer programa para melhorar a vida dos caminhoneiros, mas as nossas rodovias estaduais foram dimensionadas para um determinado volume de tráfego e peso, seja por eixo ou pelo peso bruto total”, argumenta o presidente da associação, Riumar dos Santos.
Temos a preocupação de preservar o patrimônio dos Estados”, completa Santos, lembrando as dificuldades orçamentárias já existentes. “Essas estruturas rodoviárias têm dimensionamento. Quando há um acréscimo significativo de tolerância, pode afetar.”
Em carta ao ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, a Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor) também criticou a flexibilização.
“Não é o caminhão que existe para viabilizar o pavimento. É o pavimento que existe para viabilizar o caminhão”, rebate Lauro Valdivia, assessor técnico da NTC&Logística, que representa as transportadoras de cargas. Com base em conversas com o governo, disse ter a expectativa de que 95% das multas pelos antigos critérios deixem de ser aplicadas. “Vamos ver na prática.”
Wallace “Chorão” Landim, um dos porta-vozes de caminhoneiros autônomos, diz que as queixas se devem ao desejo das concessionárias de reequilibrar contratos e dos DERs em arrecadar mais multas para seus Estados. “Estamos acabando com a máfia das balanças. Não é só a multa. Tem vezes que você perde quatro ou cinco horas na reacomodação da carga em um posto de pesagem. Afora o desgaste físico.”
FONTE: Valor Econômico